quinta-feira, 1 de setembro de 2011

O sol se põe às 6

Meus cacos, avulsos, espalhados no chão.
Repulso.
Te expulso.
Querendo te trazer pela mão.
Resisto.
Desisto.
Meu peito, convulso,
Me faz, de impulso,
Te tomar pelos pulsos,
Te  jogar nesse chão.
Entre meus cacos.
Agora nossos inteiros.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Serpente


Me parto, me mordo, me absorvo, na vã tentativa de expurgar esse demônio que habita em mim. Minhas vísceras ardem e me reviro em busca de um remédio, ou veneno. Oh por quê? Deixo Stanislavski de lado e dou meu melhor lado shakespeariano. Não, não, não, isso me rasga e devora e subtrai de mim todo meu fôlego e que vertigem. Tem um cigarro aí? Uns solos de guitarra, um deck escuro, rum para eu me sentir um pirata. Agora preciso de algo para eu ocupar as mãos: você. Mas novamente elas voltam e me arranham e as marcas estão no meu corpo que não é meu e sim seu, na verdade não existe mais nada nem meu nem seu, é nosso suor, são nossos braços, nossos gemidos, quase gritos, te aperto então desesperada, por favor, me tome, me consuma, não saia mais de mim porque tudo é frio quando não estamos assim, envoltos em líquidos e risos. Me enrosco em ti e assim deixemos o amor fluir. Ou a volúpia. Nessa noite não vejo muita diferença. Fiquemos com os dois por hora. Deixe-me então adentrar em teus olhos porque elas me perseguem, deixe-me fugir de tudo contigo, venha, venha, musa rodriguiana sou, eu sou capaz de tudo, não sou capaz de nada, deixe-me ser sua nos fogos de beltane, me tome como tua, me tenha como se fosse a última vez. Mas se apresse ah aí, por favor, elas sufocam, mas nossos suspiros e movimentos podem mantê-las longe, as sombras, elas que vivem nas casuarinas, que cantam sinistramente uma música medieval há muito esquecida, talvez seja Morgana quem as toque, talvez o bardo aleijado, por falar nisso, não, não, não é nisso, mas você me remete a tudo e tudo me remete a você, meter, e não é isso que estamos fazendo nesse momento anacrônico? Você em mim e meus laços em você, mas não é disso que eu estava falando, na verdade é disso sim, a questão é que nada é mais lindo que teus braços brancos te apoiando acima de mim e teus olhos perscrutando meu rosto desvairado como nenhuma serpente faria porque esse veneno é só seu. Então me engula, me pique, me mate, mas não saia de mim.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Apelo


Me leve, me arraste, me puxe, me envolva, me cegue, me queime, me quebre, me jogue, me pegue, me amasse, me abale, me cale, me aperte, me desperte, me abrace, me beije, me inebrie, me incendeie, me ganhe, me enlouqueça,  me conserte, me engrandeça, me mime, me aproxime, me toque, me acalme, me lasque, me queira, me perdoe, me aceite, me beba, me vicie, me abra, me segure, me cure, me descubra, me use, me lambuze, me retalhe, me cheire, me aprecie, me amacie, me desvende, me coma, me chame, me cerque, me afogue, me adule, me eleve, me pire, me atire, me roube, me use, mas não me solte, não me solte, não me deixe, não me esfrie, não me esvazie, não me desvaire, não me fujas, e se fugir, que me leve, me leve, me arraste, me puxe, me envolva.


quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Mais uma dose, por favor.

...e cada tempo, cada espaço, cada sopro é preenchido pelo vazio que há muito me dominara e as sombras, velhas companheiras, voltaram a espreitar, meus passos, antecipando meus gestos, embaralhando fragmentos de ideias, revelando minha natureza impulsiva, extremista, exagerada, exigente, sempre me sentindo isolada, não que isso importasse agora, na verdade nunca chegara a incomodar realmente, a opinião alheia sempre fora algo banal e a roda viva da sociedade desenfreada me fizera sentir alienada e um tanto peculiar diante aqueles que deveriam ser meus iguais, mas que não podiam diferir mais do meu modo louco de ver as coisas e assim julgá-las e vivê-las e tomá-las e entre elas me esgueirar desbravando o dédalo caótico de meu ser que é, agora mais que nunca, meu refúgio, abrigo, guarida nos dias grudentos e suarentos de verão onde pestilências nos assolam das manhãs febris até as noites pegajosas, nas madrugadas insones e insanas onde o nada se torna o tudo e perco o tudo nessa piscina de nada, nas longas tardes de inverno onde, encolhida no cobertos azul, presente da minha avó,  e que agora me deixa tão nostálgica , leio um livro e assim adormeço, entorpecida pela realidade que não é minha mas que mesmo assim eu tomo e embalo porque a ilusão e o apego fazem parte de mim,  assim busco uma forma de amansar aquela fera presa entre os emaranhados de meu peito, uma confusão tamanha que me perdi ali e nunca me dei o trabalho de ir me caçar, assim, perdida, fico mais confortável, o perder-se me acompanha desde meus primeiros passos, já errôneos e minhas primeiras palavras incontidas e petulantes, palavras que desencadearam em mim um ardor sem igual, palavra que move, aquece, modifica, transforma, reforma, arrasta, enlouquece, inebria, inebria como aquelas mãos que em minha pele deixam rastros de fogo, impulsos, desejos, ah, quão animalescos somos, esquecemo-nos, surtamos, perdemo-nos entre braços e abraços e carícias e afagos e contos e versos e canções e verões e num ápice nos consumimos e eclodimos e fechamos os olhos como quem pausa uma cena, rebobina a fita, assim reviro uma, duas, três, mil vezes mais minha memória, já tão ferida, na vã tentativa de reter um tempo que não mais voltará e o faço mesmo sabendo o quanto irá me machucar e assim me cego, piro e vou indo, levando, tocando, um dia rock, outro soul, i’m a country girl, faço moda, faço nada, faço birra, faço amor, selvagem é a realidades desses feitos, selvagem é o que somos, selvagens, loucos de pedra, carentes, descontrolados, perversos, reversos, e sim e não e sobrevivemos mais uma segunda-feira, empurrando até a sexta, levando a hipocrisia um pouco maia adiante e nos entregamos a devaneios tolos, queremos fugir do real e sentir o desapego abrasador mas não adianta ela ruge ela quer nos devorar ela avança na calada da noite ela puxa meus pés, me sacode, me descobre, me deixa nua diante de sua crueza, ah, a realidade não poderia ser mais severa e por isso me enveredo nesses caminhos, nessas estradas pouco gastas, nessas rotas longínquas para longe de tudo, longe de ti, longe de mim, e cada vez mais perto do vazio absoluto, me afogando nesse deserto, nessas águas imóveis que relutam em levar tudo isso para algum lugar distante, onde não possam mais me atingir, me alcançar com essas lembranças afiadas enquanto eu afundo nesse vasto triângulo de desesperos e assim, submersa, me aproximo do que seria a verdadeira chance de ser inteiramente feliz, a solidão total, só não experimentando o amor e seus apelos é que não se conhece a dor, só vivendo o vácuo para não sentir o dilaceramento causado pela falta, pela abstinência, e enquanto tudo isso não se encaixa eu vou pedindo mais uma dose, mais uma dose, por favor...